Teleny
(* texto dedicado à Prof. Drª M.J.G.A. Boucherie, por criar consciências)
porque eu não sei quantos dias passaram até ontem, num tempo em que a boca falava pelos olhos, num tempo em que o cérebro contava até dez sozinho, sem a mão, sem paragens, sem erros de cálculo, sem desnortes em sequência
(três, cinco, dois, quatro, um)
- há uma parte da blusa branca que não se sujou com o molho da carne do jantar
(dois, quatro, seis)
os livros a mexer na prateleira, os livros a fazer demasiado barulho na prateleira, a prateleira a gritar com medo, a querer fugir
- a saia, o molho da carne, o prato virado ao contrário no colo
(cinco, um, zero)
eu já não sei contar com a cabeça porque já não sei existir
- a saia
(dez, três, sete, cinco, nove)
- gosto quando é nove
o metro, Lisboa, as iluminações de Natal presas aos postes na rua, eu a vê-las da janela do carro em condução, elas a dizerem que é Natal, outro ano a chegar, eu a explicar-lhes que se fez Natal demasiado cedo, que não estava preparada, que não estás mais cá para ver
(porque já não sei: um, quatro, cinco, sete, dois, nove outra vez)
- tu a falar de nós, a dizer que nós: a tua boca a cristalizar, a ganhar gelo nos cantos
Dois, sete, oito, zero, quatro, cinco.
Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez.
Zero.
porque eu não sei quantos dias passaram até ontem, num tempo em que a boca falava pelos olhos, num tempo em que o cérebro contava até dez sozinho, sem a mão, sem paragens, sem erros de cálculo, sem desnortes em sequência
(três, cinco, dois, quatro, um)
- há uma parte da blusa branca que não se sujou com o molho da carne do jantar
(dois, quatro, seis)
os livros a mexer na prateleira, os livros a fazer demasiado barulho na prateleira, a prateleira a gritar com medo, a querer fugir
- a saia, o molho da carne, o prato virado ao contrário no colo
(cinco, um, zero)
eu já não sei contar com a cabeça porque já não sei existir
- a saia
(dez, três, sete, cinco, nove)
- gosto quando é nove
o metro, Lisboa, as iluminações de Natal presas aos postes na rua, eu a vê-las da janela do carro em condução, elas a dizerem que é Natal, outro ano a chegar, eu a explicar-lhes que se fez Natal demasiado cedo, que não estava preparada, que não estás mais cá para ver
(porque já não sei: um, quatro, cinco, sete, dois, nove outra vez)
- tu a falar de nós, a dizer que nós: a tua boca a cristalizar, a ganhar gelo nos cantos
Dois, sete, oito, zero, quatro, cinco.
Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez.
Zero.
como será que vais escrever com 40, menina? :=P
***