4.11.06

Teleny

(* texto dedicado à Prof. Drª M.J.G.A. Boucherie, por criar consciências)


porque eu não sei quantos dias passaram até ontem, num tempo em que a boca falava pelos olhos, num tempo em que o cérebro contava até dez sozinho, sem a mão, sem paragens, sem erros de cálculo, sem desnortes em sequência
(três, cinco, dois, quatro, um)
- há uma parte da blusa branca que não se sujou com o molho da carne do jantar

(dois, quatro, seis)

os livros a mexer na prateleira, os livros a fazer demasiado barulho na prateleira, a prateleira a gritar com medo, a querer fugir
- a saia, o molho da carne, o prato virado ao contrário no colo

(cinco, um, zero)
eu já não sei contar com a cabeça porque já não sei existir
- a saia

(dez, três, sete, cinco, nove)
- gosto quando é nove

o metro, Lisboa, as iluminações de Natal presas aos postes na rua, eu a vê-las da janela do carro em condução, elas a dizerem que é Natal, outro ano a chegar, eu a explicar-lhes que se fez Natal demasiado cedo, que não estava preparada, que não estás mais cá para ver

(porque já não sei: um, quatro, cinco, sete, dois, nove outra vez)
- tu a falar de nós, a dizer que nós: a tua boca a cristalizar, a ganhar gelo nos cantos

Dois, sete, oito, zero, quatro, cinco.
Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez.
Zero.

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

como será que vais escrever com 40, menina? :=P

***

11:50 da manhã  

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