[se alguma coisa eu permaneço]
se alguma coisa eu permaneço é esta vontade de subir pelas paredes
da rua onde nasci e levantar voo pela cidade até que possa encontrar,
seja longe ou seja perto, uma construção inacabada dos dias por passar.
vai-se o corpo pela luz dos dias feitos noite quase a meio,
acendem-se os candeeiros das casas fechadas às saídas depois de jantar,
abre-se a solidão em ramos de rosas que não se vendem nas floristas.
se alguma coisa eu permaneço é nesta certeza da morte sem fim
que se nos oferece a cada dia na cidade, porque é da cidade que falo,
até porque mais nada haveria para dizer que este som do trânsito
esvaíndo-se pelos esgotos que agora são tratados nos arrabaldes
e que já não chegam ao mar, não, já não poluem as vistas turísticas
nem incomodam o peixe que se grelha mesmo à beira da praia.
se alguma coisa eu permaneço é esta fotografia tirada há alguns anos
quando eu ainda era jovem e os sonhos todos me eram permitidos
mesmo aqueles que envolviam o amor, as árvores e os castelos.
agora persigo despido as vozes que me falam pela casa vazia
e o meu cheiro é o da loiça que ainda não foi lavada e já tem dias,
essa loiça que não desaparece, como desaparece o resto do meu mundo.
da rua onde nasci e levantar voo pela cidade até que possa encontrar,
seja longe ou seja perto, uma construção inacabada dos dias por passar.
vai-se o corpo pela luz dos dias feitos noite quase a meio,
acendem-se os candeeiros das casas fechadas às saídas depois de jantar,
abre-se a solidão em ramos de rosas que não se vendem nas floristas.
se alguma coisa eu permaneço é nesta certeza da morte sem fim
que se nos oferece a cada dia na cidade, porque é da cidade que falo,
até porque mais nada haveria para dizer que este som do trânsito
esvaíndo-se pelos esgotos que agora são tratados nos arrabaldes
e que já não chegam ao mar, não, já não poluem as vistas turísticas
nem incomodam o peixe que se grelha mesmo à beira da praia.
se alguma coisa eu permaneço é esta fotografia tirada há alguns anos
quando eu ainda era jovem e os sonhos todos me eram permitidos
mesmo aqueles que envolviam o amor, as árvores e os castelos.
agora persigo despido as vozes que me falam pela casa vazia
e o meu cheiro é o da loiça que ainda não foi lavada e já tem dias,
essa loiça que não desaparece, como desaparece o resto do meu mundo.
Eu vou ajudar à loiça, queres?
errr...
às vezes os poetas ficam sem palavras.
Excelente texto, a inquietude das lembranças.