Handicap
O silêncio só era cortado pelo vruummmm do cortador de relva, algures no Buraco 8. Ricardo sentava-se à beira da piscina deserta, o conjunto de tacos a seu lado como única companhia.
Os gestos que fazia repetiam-se, sempre iguais: De quando em quando, estendia a mão para o copo old fashioned onde o gelo derretia devagar, sorvia lentamente o Bourbon e pousava com cuidado o copo no rebordo da mesa, olhando em seguida o mar muito ao fundo, o branco violento das ondas em pleno Inverno.
A maior parte do tempo tentava não pensar. Como não conseguia, fazia por concentrar-se no que o circundava. Tudo aquilo que o seu dinheiro podia comprar, a simples possibilidade de estar ali, rodeado por uma serenidade e um conforto que poucos tinham ao seu alcance.
De nada adiantava. O medo permanecia e o tremor das mãos denunciava o seu verdadeiro estado de espírito. Volta e meia, imagens de uma violência vermelha relampejavam-lhe na memória. Então, fechava os olhos na tentativa de apagá-las só conseguindo que surgissem com ainda mais detalhes e nitidez.
O cortador de relva aproximava-se agora e o ruído de fundo transformava-se num ominoso e insuportável prenúncio. O Bourbon terminara e o gelo permanecia no copo, tão frio como o ar que agora o vento vindo do mar tornava cortante e lhe enregelava as mãos. Com um gesto, chamou o empregado invísivel que se materializou com prontidão e pagou-lhe sem uma palavra.
Queria levantar-se, regressar ao inevitável. Mas as pernas entorpecidas não lhe obedeciam e a vontade impelia-o em outra direcção. Ergueu-se finalmente, contornou a piscina e entrou no green. Caminhava cada vez mais rapidamente em direcção ao Buraco 3, Par 4, e à falésia que o limitava. Desta vez, não levava consigo os tacos.
Os gestos que fazia repetiam-se, sempre iguais: De quando em quando, estendia a mão para o copo old fashioned onde o gelo derretia devagar, sorvia lentamente o Bourbon e pousava com cuidado o copo no rebordo da mesa, olhando em seguida o mar muito ao fundo, o branco violento das ondas em pleno Inverno.
A maior parte do tempo tentava não pensar. Como não conseguia, fazia por concentrar-se no que o circundava. Tudo aquilo que o seu dinheiro podia comprar, a simples possibilidade de estar ali, rodeado por uma serenidade e um conforto que poucos tinham ao seu alcance.
De nada adiantava. O medo permanecia e o tremor das mãos denunciava o seu verdadeiro estado de espírito. Volta e meia, imagens de uma violência vermelha relampejavam-lhe na memória. Então, fechava os olhos na tentativa de apagá-las só conseguindo que surgissem com ainda mais detalhes e nitidez.
O cortador de relva aproximava-se agora e o ruído de fundo transformava-se num ominoso e insuportável prenúncio. O Bourbon terminara e o gelo permanecia no copo, tão frio como o ar que agora o vento vindo do mar tornava cortante e lhe enregelava as mãos. Com um gesto, chamou o empregado invísivel que se materializou com prontidão e pagou-lhe sem uma palavra.
Queria levantar-se, regressar ao inevitável. Mas as pernas entorpecidas não lhe obedeciam e a vontade impelia-o em outra direcção. Ergueu-se finalmente, contornou a piscina e entrou no green. Caminhava cada vez mais rapidamente em direcção ao Buraco 3, Par 4, e à falésia que o limitava. Desta vez, não levava consigo os tacos.
Que texto forte! Solidão, angústia, vazio, desespero. Está tudo lá. Este personagem percebe-se que está bem na vida, financeiramente falando.
No entanto...as aparências iludem.
Nunca sabemos quem temos ao lado, nem que realidades escondem.
Muito muito bom!!
Também eu não consigo resistir á tentação de urinar de alto, num dia de inverno, com o vento a desafiar a secura dos meus sapatos.
(Desculpa.Mas sabes que sou fraco...)
Pobre homónimo! ;)
Os vossos textos tranformaram a minha visita a este blogue num prazer cada vez mais maiúsculo.
Parabéns e obrigada.
gosto de onomatopeias
Pois, apapariquem o Ricardo! O do texto, claro. Eu que sou um reconhecido defensor dos injustiçados tenho que fazer referência aos pobres tacos, que, tendo sido sempre exemplos de fidelidade, ficaram sem companhia. E olhem que, no que deles há de emblemático, o comentário é mais sério do que parece...
Assustador, caro João
a s s u s t a d o r
Só desejo q todas as falésias tenham rede..
Bem escrito, parabéns
É curioso ... alguns comentários tentam aligeirar e brincam com a questão...
Obrigada Paulo pela imagem dos tacos, .. genial
Os fieis companheiros tacos clamam, gritam e cantam:
"ne me quites pas"
"ne me quites pas"
"NE ME QUITES PAS"
ne me quites pas
ne me quites pas
ne me quites pas