Shangri-la dos sentidos
Ao acordar, Anderson teve a consciência imediata de quem era. Soube, também de forma nítida, que não sonhara. Recordou a sua vida luminosa. O passado era uma passagem tépida, a travessia de uma existência confortável, a ordem da respiração transparente, o meigo toque de veludo. E, no entanto, tudo tinha sido aparentemente real. Com energia enraivecida, retirou as sondas da nuca, libertando-se dos fios que o tinham amarrado à cama. E, no entanto, era ele mesmo, ainda era ele quem fazia mexer os seus braços. E teve então a noção concreta de que até ali, enquanto sonhara o devaneio que não era sonho, ao mexer o seu corpo, não era ele quem o movia; ao sentir prazer, não era ele quem desencadeava o processo do sentir.
Enquanto lhe regressava a memória, aos soluços, invadia-o também uma cruel nostalgia pelo que tinha sido a existência perfeita, o Shangri-la dos sentidos, a imersão total na fantasia.
E lembrou-se, a culpa era sua: pedira expressamente para ser acordado uma semana antes do fim.
“Mas poderemos prolongar a sua existência”, objectara o doutor Roberts. “Nessa semana, terá a sensação de viver dois anos”.
“Quero ver a verdade”, dissera Anderson.
Agora era tarde. Saiu da cama, apesar de ter os músculos enfraquecidos. Aproximou-se da janela e viu o esplendoroso espectáculo do fim do mundo. O buraco negro crescera e parecia engolir metade do céu. Dentro de uma semana, o Sol seria destruído e ele, Anderson, seria o único ser humano a contemplar a destruição total do planeta, porque escolhera assim, para ser diferente de todo o resto da humanidade. Enquanto os outros biliões de seres humanos dormiam o seu sono beatífico, ele tinha acordado da contemplação maquinal uma semana antes.
“Perdi dois anos de vida virtual”, pensou, “para acabar aqui sozinho”.
O mundo que lhe restava era aquele. À sua frente, havia apenas uma semana de horrível eternidade.
Enquanto lhe regressava a memória, aos soluços, invadia-o também uma cruel nostalgia pelo que tinha sido a existência perfeita, o Shangri-la dos sentidos, a imersão total na fantasia.
E lembrou-se, a culpa era sua: pedira expressamente para ser acordado uma semana antes do fim.
“Mas poderemos prolongar a sua existência”, objectara o doutor Roberts. “Nessa semana, terá a sensação de viver dois anos”.
“Quero ver a verdade”, dissera Anderson.
Agora era tarde. Saiu da cama, apesar de ter os músculos enfraquecidos. Aproximou-se da janela e viu o esplendoroso espectáculo do fim do mundo. O buraco negro crescera e parecia engolir metade do céu. Dentro de uma semana, o Sol seria destruído e ele, Anderson, seria o único ser humano a contemplar a destruição total do planeta, porque escolhera assim, para ser diferente de todo o resto da humanidade. Enquanto os outros biliões de seres humanos dormiam o seu sono beatífico, ele tinha acordado da contemplação maquinal uma semana antes.
“Perdi dois anos de vida virtual”, pensou, “para acabar aqui sozinho”.
O mundo que lhe restava era aquele. À sua frente, havia apenas uma semana de horrível eternidade.
Belo blogue, meu caro. Andavas a ameaçar e conseguiste. Parabéns!