3.6.06

o sapo

o sapo volta a casa quando o dia nasce, mãos nos bolsos,
o fato amassado de encontrões e algumas quedas,
um cigarro segurando o hálito a cerveja e mais cigarros.
tem curta esperança de vida, o sapo.
tudo começou umas horas antes, uns dias, uns meses antes,
numa máquina de costura que juntou peças de tecido
amarelas e verdes, que com pregas fez umas patas
e colou uns olhos bem grandes de sapo no topo da cabeça.
não há mais nenhuma esperança nesta vida para um sapo
que a de encontrar uma princesa que lhe salve do seu destino
de morrer inchado com um cigarro nos lábios
empurrado por um monte de crianças à procura de experiências.
a noite inteira foi cerveja e vinho pelos bares
uma correria acima e abaixo por ruas apertadas
umas quantas caras conhecidas a desfocarem-se pelas horas
e pedrinhas de haxixe a desfazerem-se em rodas de muitas mãos.
a tudo isto sobrevive um verdadeiro sapo, o sapo artista,
o sapo cantor de modinhas esquecidas, o sapo que pinta pelas paredes
alguns pregões, o sapo que discorre sobre a funcionalidade
da maquinaria numa indústria e impressiona assim algumas adolescentes.
o sapo volta, enfim, a casa, quando o dia nasce de um sol quente
e pelas ruas já só sobra o lixo acumulado da loucura da noite.
o sapo perdeu o telemóvel e resta-lhe uma princesa incontactável.
acabou-se o carnaval, sapo, podes arrumar outra vez o fato.

1 Comments:

Blogger dora said...

... e, ao arrumar o fato, o sapo
percebeu que afinal era um príncipe emancipado que não precisava do beijo-mágico da princesa!
( só que assim não era a mesma coisa! Valia-lhe de pouco )

12:43 da manhã  

Enviar um comentário

<< Home